Augusto Boal

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Entrevista Carta Maior com Cecilia Boal

16.08.2011

A imprensa anunciou que o acervo de Augusto Boal seria transferido para os Estados Unidos, para ser recuperado e preservado por uma fundação estadunidense. Qual é a real situação dessa transferência?
Cecília Boal: Creio que existe ainda no Brasil um problema em relação à preservação da memória e seria interessante entender as razões. A novela do acervo do Boal é muito semelhante às historias que relatam outras famílias igualmente responsáveis por outros acervos. E é muita responsabilidade! É muito difícil preservar um acervo. Difícil e caro. Que interesse tem preservar um monte de papeis velhos? Para alguns, muito, para outros, nenhum.  Para as famílias tem, além do mais, outro conteúdo, um grande valor afetivo. Creio que todos ficam muito penalizados vendo tudo se estragar.
Somos testemunhas diretas desse estrago. Boal morreu em maio de 2009 , estamos em agosto de 2011. Tudo que havia na minha casa (e digo isso porque creio que deve haver coisas do Boal espalhadas pelo mundo), ou quase tudo, foi transferido para a biblioteca da Unirio onde ficou da mesma forma, sem tratamento e sem as condições requeridas. Aparentemente seria um ótimo lugar. Uma universidade onde se estuda teatro, estudantes interessados podendo pesquisar. Porem não foi assim e a gente nunca vai saber o que aconteceu exatamente. Cansei e trouxe de novo tudo para minha casa. Agora  aluguei uma salinha em Botafogo e todas as coisas estão lá e vão continuar lá até que se encontrem as condições para que sejam realmente preservados.  Agora eu quero ter a garantia absoluta.
A New York University, onde Boal sempre trabalhou,  mostrou interesse em ter a guarda desse acervo, para higienizá-lo , cataloga-lo e colocar uma cópia integral na internet, ou seja, à disposição de todos , em qualquer lugar do mundo e de forma inteiramente  gratuita. Existe dentro desta biblioteca um setor chamadoTamiment Library  totalmente consagrado a autores da esquerda e à historia do sindicalismo no mundo.  É muito interessante e vale a pena entrar no link  para conferir. Eu pessoalmente acho que o Boal estaria em excelente companhia neste espaço e seria muito bem tratado. Porém, também acho que  as histórias que se originaram no contexto de uma determinada cultura pertencem a ela e é ali que devem continuar.
– Que perspectivas estão abertas para que o acervo de Augusto Boal permaneça no Brasil?
Cecília Boal: Comuniquei a Universidade Federal do Rio de Janeiro que gostaria que eles tivessem a guarda e ao ministro da Educação, Fernando Haddad, que gostaria de conversar com ele. A UFRJ se mostrou muito interessada e o ministro me telefonou, pedindo que a UFRJ mandasse um projeto nesse sentido que ele o apoiaria.  Faria o maior sentido Boal permanecer na UFRJ e, mais precisamente, na Praia Vermelha. Foi lá que ele obteve um diploma de engenharia química antes de se dedicar ao teatro.
– O que há de concreto no oferecimento do Ministro da Educação, Fernando Haddad, da disposição do governo brasileiro de fornecer as condições para que o acervo permaneça no Brasil?
Cecília Boal: Agora a bola está no nosso campo, nos é que temos que enviar um projeto para o Haddad. Acontece que temos que agir com muita rapidez. Todos os itens do arquivo estão em condições avançadas de deterioração: cartas, fotos, fitas VHS, etc. Penso que muitas coisas terão que ser definidas nos próximos seis meses.
A imprensa falou em novo exilio e repatriamento. Não deixa de ser isso, de uma certa maneira. Mas as condições têm que ser criadas para que alguém volte para casa e possa nela ficar. A obra do Boal hoje pertence a todos aqueles que se interessam por ela no mundo e o nosso desejo e a nossa vontade como família é que todos possam usufruir desse legado. Hoje em dia, com as condições que as novas tecnologias nos oferecem, não tem sentido deixar um acervo se perder e se estragar. Estamos confiantes e acreditando que o governo atual fará todo o possível para que este acervo seja bem cuidado.
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