Augusto Boal

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Artes e Letras: Entrevistas

07.02.2017

Em 2006 Boal deu uma entrevista para a publicação Artes e Letras: Entrevistas da EDUSP.
Segue trechos do ele disse:
por Walnice Nogueira Galvão Teoria e Debate, abril de 2006
“Uma das maiores expressões do teatro brasileiro nos conta um pouco de sua história, parte já publicada em Hamlet e o Filho do Padeiro: Memórias Imaginadas”.
Como você descobriu o teatro?
Quando eu era criança, não havia telenovela, mas o correio trazia, todo fim de semana, fascículos de romances, O Conde de Monte Cristo, A Ré Misteriosa. Minha mãe comprava, lia e dava para a gente ler. No domingo, toda a família se reunia em casa para almoçar, um almoço “ajantarado”. Vinham 25, trinta pessoas. Irmãos e primos, nos juntávamos e dramatizávamos os fascículos. Minha estreia no teatro foi aos nove anos. Mas minha estreia dirigindo foi em Nova York.

E como se deu a politização?
A politização foi fora do teatro. Meu pai era dono de uma padaria e, desde os onze anos, eu o ajudava. Então, via uma população de trabalhadores do curtume carioca que frequentavam a padaria, a maioria negros e todos pobres. A politização se deu pelo choque de classes. Minha família não era rica: meu pai tinha padaria, duas ou três casas na Penha, um bairro operário, mas havia uma diferença muito flagrante entre mim e os colegas que jogavam futebol comigo. Eles eram pobres, passavam por dificuldades. Na hora de jogar futebol, o time era coeso, “todos por um e um por todos”. Depois, um ia dormir numa casa com o chão todo quebrado e eu ia para uma casa bonita e gostosa. Isso dava a um jovem com aquela idade um sentido de que alguma coisa estava errada. O senso de injustiça despertou.
Como você se encaminhou para o teatro com essa idade?
Por volta dos nove anos, comecei a escrever peças sobre essas pessoas, sobre aquela gente. E fiquei amigo do Abdias Nascimento, fundador do Teatro Experimental do Negro. Como eu trabalhava e minhas peças eram sobre os negros que eu conhecia, passei a entregá-las a ele. Uma vez ele quase encenou uma peça minha com Grande Otelo chamada Martim-Pescador, baseada na vida de pescadores.

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