Augusto Boal

Blog

“Quando comecei a dirigir este espetáculo, ficou patente que o uso dos nossos instrumentos, ritmos e danças, não era apenas um recurso formal episódico: estávamos penetrando em uma área de pesquisa estética mais profunda, que não se contentava com a simples troca de roupagens musicais. O mestre e maestro Marcos Leite, diretor musical e orquestrador, criou uma versão nossa daquela ópera universal, sem medo de uma “Habanera” em tango negro, ou um “Goleador” de cuíca e tamborim.
A ideia de “cultura pura” é abstração, puro “conceito” sem existência concreta. Tentativas de se preserver a “pureza” cultural são vãs, como a pureza étnica. As culturas dialogam, importam e exportam: formam-se, às vezes, “combinações”, onde algo totalmente novo surge e outras vezes “amálgamas”, onde certos elementos conservam parte de sua individualidade.
A este novo gênero, que aqui inauguramos, deveria corresponder um novo nome: é preciso nomear o que existe para que sua existência se torne visível. Por isso, optamos por chamar nosso espetáculo de “Sambópera”. É duas vezes seu nome: é opera e é musical brasileiro. No “Sambópera” misturam-se ritmos, melodias, cores e culturas: mas o coração é um só!”
Trecho selecionado de texto do Augusto Boal contido no programa da peça Carmen, Sambópera.
AB.RCf.020w

Na foto Cláudia Ohana e Marcelo Escorel em cena. Fotografia de Cláudia Ribeiro disponível em nosso acervo: www.acervoaugustoboal.com.br

O Instituto Augusto Boal recebeu do SESC de Vila Mariana cartas escritas na exposição Meus Caros Amigos – Cartas do Exílio no mês de junho, do ano passado em atividade proposta pelo Educativo. Dentre as várias demonstrações de apreço, encontramos esta carta da jornalista e crítica de teatro Beth Néspoli e gostaríamos de compartilhar:

Carta Beth Néspoli
 

“O ano de 1968 foi muito agitado para o pessoal do teatro. Numa conversa entre o Lauro César Muniz, o Augusto Boal, o Plínio Marcos e o Jorge Andrade, surgiu a ideia de fazer um espetáculo coletivo onde se procuraria responder à questão “O que pensa você do Brasil de hoje?”. Imediatamente o Boal propôs que o Teatro de Arena produzisse o evento, e eles convidaram o Gianfrancesco Guarniere e o Bráulio Pedroso para participar também. Os autores escreveram seis peças curtas: O líder (Lauro), É tua a história contada? (Bráulio), Animália (Guarniere), A receita (Jorge), Verde que te quero verde (Plínio) e A lua muito pequena e a caminhada perigosa (Boal). As peças eram entremeadas de canções: “Tema de abertura” (Edu Lobo), “Enquanto seu lobo não vem” (Caetano Veloso), “M.E.E.U.U. Brasil brasileiro” (Ary Toledo), “Espiral” (Sérgio Ricardo) e “Miserere nobis (Gilberto Gil). O Arena havia criado uma fórmula de unir o teatro com a música nos seus espetáculos de grande sucesso – Arena conta Zumbi e Arena conta Tiradentes – que funcionava muito bem, e a fórmula seria adaptada para a I Feira Paulista de Opinião.

Entre os corajosos atores que participaram da Feira estavam a Aracy Balabanian, o Renato Consorte, a Miriam Muniz, o Rolando Bondrin, a Cecília Thumim Boal, o Antonio Fagundes, o Luís Carlos Arutin, o Luiz Serra, o Zanoni Ferrite. No saguão do teatro, havia obras de artistas como Nelson Leirner (um longo túnel verde e amarelo), de Marcello Nitsche, do Mário Gruber, do Cláudio Tozzi. A cenografia e os figurinos foram do Marcos Weinstock, e a direção musical do maestro Carlos Castilho. Eu fiz o cartaz da Feira, baseado num antigo anúncio do Xarope São João, onde aparece a ilustração do homem sendo amordaçado, com a legenda “Larga-me… deixa-me gritar!”. No meu cartaz, lia-se: “Largue-me, deixe-me falar”. Na época, a divulgação mais efetiva do teatro era pregar cartazes em todos os muros da cidade, então São Paulo foi toda empapelada com o cartaz da Feira, o que me deixou superemocionado. A primeira vez que entrevistei Augusto Boal no meu talk show, ele me levou de presente o original do cartaz. Participei da Feira também com uma pintura que acabou dando muita repercussão, e me expôs ainda mais aos órgãos censores e repressores da ditadura. Ela retratava um general sentado na privada e tinha o título O repouso do guerreiro. O curioso é que, coincidentemente, no texto do Plínio Marcos para a I Feira Paulsita de Opinião tinha um militar do departamento de censura que ia ao banheiro, usava um capacete como penico e se limpava com o texto da uma peça. Dá pra ver que havia uma sintonia no grupo que se uniu em torno do evento. O Boal sempre abria o espetáculo dizendo que o evento era o primeiro ato de desobediência civil feito nos palcos e mostrava o meu quadro, que sempre provocava gargalhadas. (mais…)

A Traviata foi a segunda sambópera dirigida por Augusto Boal e estreou em janeiro de 2002 no Teatro Glaucio Gill, no Rio de Janeiro. La Traviata é adaptação da ópera italiana La Traviata de Giuseppe Verdi. A transposição do texto para o português foi feita por Augusto Boal e Celso Branco. As Traviatas, de Verdi e Boal, são baseadas no romance de Alexandre Dumas “A Dama das Camélias”.

“Neste espetáculo, como sempre, está presente o meu multiculturalismo: vivi alguns dos melhores anos da minha vida no exílio, de cá pra lá, em países tão diferente uns dos outros – e ainda mais diferentes de si mesmos! Não podia voltar à pátria amada clamando aos microfones que continuo em busca dos meus chinelos e do meu cachorro: sei que o vira-latas morreu faz tempo, e os chinelos, livros, CDs e rotos sapatos que se perderam nos caminhões de alguma mudança apressada. Não esperem, de mim, a pureza de um passista da Mangueira”

Escreveu Boal no livreto de A Traviata, a respeito de seu multiculturalismo, o reflexo do exílio em sua obra.

AB.RTRt.001 aw

Cartaz da peça A Traviata, realizada em janeiro de 2002, no Rio de Janeiro. Disponível em nosso acervo: www.acervoaugustoboal.com.br

No ano de 1999 Augusto Boal estreia em seu teatro um novo gênero, denominado por ele sambópera. O gênero dedica-se à um trabalho de releituras de clássicos da ópera para o contexto da virada do século XX no Brasil.

A multiculturalidade é a característica principal do gênero criado pelo autor, que traduz as músicas clássicas originais para ritmos genuinamente brasileiros.

Sua primeira peça montada neste sentido foi Carmen. A sambópera Carmen, de Boal, é adaptação da ópera de Georges Bizet, homônima. A montagem teve a tradução para o português e adaptação para o teatro feita por Boal, a elaboração da poesia por Celso Branco, e a direção musical é assinada por Marcos Leite.

Reprodução de cartaz, peça de Algusto Boal, acervo Cecilia Boal

Cartaz da peça encenada no CCBB do Rio de Janeiro. Disponível em nosso acervo: www.acervoaugustoboal.com.br

RECEBEMOS ONTEM ESTE PRESENTE DE NATAL QUE CONVIDAMOS VOCES TODOS A LER COM ATENÇÃO
LEI Nº 13.560, DE 21 DE DEZEMBRO DE 2017.
Institui o Dia Nacional do Teatro do Oprimido.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Fica instituído o Dia Nacional do Teatro do Oprimido a ser comemorado, anualmente, no dia 16 de março, em todo o território nacional, em homenagem à data de nascimento de seu criador, o teatrólogo Augusto Boal.
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 21 de dezembro de 2017; 196o da Independência e 129o da República.
MICHEL TEMER
Provavelmente algum deputado ou deputada do Pt encaminhou este projeto de lei para o Congresso e esqueceu de retira lo depois do golpe contra o seu partido
Entendemos que isso possa ter acontecido e pensamos  que quem encaminhou este projeto  o fez com toda boa vontade
Porém não podemos deixar de nos posicionar diante deste fato que não nos honra, em absoluto , nem enaltece o nome de Augusto Boal
Se Boal estivesse ainda vivo estaría escrevendo algo muito parecido
Como podemos aceitar ” homenagens” de num governo golpista que mostra claramente a que veio, vendendo e entregando o Brasil para as multinacionais e deixando o povo mais oprimido e miserável ainda?
Estamos indignados diante de tamanha indecencia e nos perguntamos perplexos se  Michel Temer 1ro: lê o que  assina  e  2 : se ele por ventura sabe quem é Augusto Boal
CECILIA T BOAL

30D03F_2
O Show Opinião foi criado por integrantes do Centro Popular de Cultura da UNE, produzido pelo Teatro de Arena e dirigido por Augusto Boal no Rio de Janeiro. Contava com Nara Leão, Zé Ketti e João do Valle no elenco. O registro do show deu origem ao álbum “Show Opinião”, lançado em 1965 e disponível em nosso SoundCloud.

Hoje Flávio Império estaria completando 82 anos.
Boal comenta em “Hamlet, O Filho do Padeiro” que Flávio começou a escrever cenários com ele, no Teatro Arena.
“Maria Teresa Vargas, nossa amiga, conhecia um jovem arquiteto, Flávio Império, que nunca tinha feito cenário mas tinha vasto talento pra pintar e construir com as mãos. Ao contrário de se espantar com a exiguidade, achou desafio. Foi me fazendo perguntas e, quando me dei conta, eu estava falando, ele desenhando.”
No Arena ele criou diversas cenografias de peças dirigidas por Boal como: O Melhor Juíz, O Rei; Um Bonde Chamado Desejo; Arena Conta Zumbi; Arena Conta Tiradentes.

4-arenas-sentados-no-chao_premio-saci

Juca de Oliveira, Flávio Império, Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri reunidos com o troféu do Prêmio Saci. Foto disponível em:http://www.acervoaugustoboal.com.br/

Riva Nimitz que hoje faria 81 anos iniciou sua carreira no Teatro de Arena nos anos 50.
Fez parte do elenco das peças Ratos e Homens (1956), Marido Magro, Mulher Chata (1957), Juno e o Pavão (1957), Eles Não Usam Black-Tie (1958), Chapetuba Futebol Clube (1959), Gente como a Gente (1959), A Farsa da Esposa Perfeita (1959), Revolução na América do Sul (1960), O Testamento do Cangaceiro (1961) e A Mandrágora (1962). Algumas delas dirigidas por Boal.
 

AB.AMMf.022

Riva Nimitz e Geraldo Ferraz em cena em Marido Magro, Mulher Chata. Disponível em: http://www.acervoaugustoboal.com.br/

O Show Opinião teve sua estreia dia 11 de dezembro de 1964 com Nara Leão, João do Valle e Zé Ketti no elenco. Semanas após a estreia, Nara Leão se afastou do espetáculo por problemas de saúde e indicou para lhe substituir uma cantora que havia conhecido na Bahia tempos antes: Maria Bethânia, que veio para o Rio de Janeiro na companhia de seu irmão, Caetano Veloso. Foi o início da carreira da cantora baiana, famosa por sua consagrada interpretação da música “Carcará”, composta por João do Vale e José Cândido.
Em “Hamlet e o filho do padeiro”, Augusto Boal relata seu primeiro contato com Bethânia:

Bethânia, figura impressionante: menina magra convicta, sólida voz que voava, enchendo a cena, descendo escadas, fugindo pelas janelas, transbordando ruas, avenidas, praias. Cedo, a voz de Bethânia transbordaria por toda Copacabana, Rio de Janeiro, mundo afora.

AB.AOt.001 aw.jpg

Capa do programa de Opinião, disponível em: http://www.acervoaugustoboal.com.br/