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LIBERTAÇÃO DOS OPRIMIDOS
por Adaílton Medeiros
“Eu agradeço a essa plateia pela aula de cidadania que eu tive aqui, hoje.” Foi assim que o cineasta Zelito Viana encerrou o Programa Diálogos Com o Cinema, no Ponto Cine, no último sábado, 22/10. O filme exibido: Boal, vencedor do Margarida de Prata.
Como se não bastasse uma semana cheia de surpresas: Ponto Cine como destaque em artigo da Revista ESPM, da Escola Superior de Propaganda e Marketing, e em matéria do Globo Zona Norte. E, ainda, a repercussão da participação nas mesas do Seminário Novas Perspectivas para o Cinema Brasileiro, no 44º Festival de Brasília e da Audiência Pública da Assembléia Legislativa para a discussão de Políticas para o desenvolvimento do Circuito Exibidor Cinematográfico do RJ. Estávamos curtindo o gostinho de ter contribuído da construção, melhor, do acabamento do grande vencedor do Festival do Rio, o Filme “A hora e a vez de Augusto Matraga”, de Vinícius Coimbra.
O teste de público do primeiro longa de Vinícius foi realizado no Ponto Cine e, lógico, o mais novo diretor consagrado pelo maior Festival de Cinema da América Latina recebeu “piruadas” de todos os tipos e tamanhos. Afinal suburbano gosta de meter o bedelho em tudo, é metido a sabido e adora ocupar espaço, agora então que a tal “nova classe média” entrou na moda nos achamos. A prova está lá nos crédidos do filme, estamos todos orgulhos e não cabemos na nossa respiração.
Mas se fosse só isso. Para completar quem aparece para assistir ao “Boal”: Dona Maria Apareceida. Quem é a Dona Maria? Uma já tarimbada frequentadora do Ponto Cine, uma senhora comum de 75 anos. Quer dizer: comum até antes do Festival. Agora, Aparecida é uma estrela, talvez a maior do Ponto Cine.
Um dia a anônima Maria, ao ler um anúncio de classificados convocando pessoas que quisessem cantar uma música que marcou a sua vida, resolveu ligar para a produção de um filme. Mesmo descrente, foi chamada e, “de um dia para o outro”, como diz, ficou famosa. Aparecida é uma das personagens mais forte de “Canções”, de Eduardo Coutinho, vencedor de Melhor Documentário do Festival do Rio.
A nova estrela foi anunciada na abertura do evento, veio ao palco falar com a plateia e, como não podia deixar de ser, cantou. Foi aplaudida de pé e cumprimentada por todos, após a sessão.
E o Boal, onde entra nisso tudo? Na síntese. Fernando Pessoa dizia que Educação é erudição e Cultura, síntese. O Filme de Zelito Viana não é só uma homenagem a um dos maiores nomes da Cultura Brasileira, ou melhor, da Cultura Sem Fronteira, porque Boal foi um cidadão do mundo.
Antes de ser uma homenagem é um pito, um puxão de orelha: – como querer ser uma nação grandiosa se tratamos tão mal os nossos herois, condenando-os quase ao total anonimato?
Não sei se “Canções” entrará em cartaz no Ponto Cine. Torço para que sim, se não somente os privilegiados do bairro e de seu entorno, que estiveram na manhã de sábado no Cinema, vão ficar sabendo do feito da Dona Maria Aparecida.
Uma coisa instintivamente eu posso afirmar: hoje, Boal está para o conhecimento dos brasileiros, assim como a nossa cantora Maria está para Guadalupe. Precisamos virar o jogo. Zelito, obrigado. Sábado foi um dia de oprimidos sobre opressores. Foi um dia de libertação, de síntese. Um dia de suburbanos vencedores.
O Senado aprovou nesta quarta-feira (26) em votação simbólica a criação da Comissão da Verdade, que irá apurar violações aos direitos humanos entre 1946 e 1988, período que inclui a ditadura militar. O texto, que já havia sido aprovado pela Câmara em 21 de setembro, segue para sanção presidencial de Dilma Rousseff.
A comissão terá dois anos para produzir um relatório, com conclusões e recomendações sobre os crimes cometidos. Durante as investigações, o grupo poderá requisitar informações a órgãos públicos, inclusive sigilosas, convocar testemunhas, realizar audiências públicas e solicitar perícias.
Segundo o relator da proposta no Senado, senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), a comissão terá como objetivo “efetivar o direito à memória e à verdade histórica” e “promover a reconciliação nacional”.
“Temos uma ferida que não vai se fechar nunca, qualquer que seja o resultado da comissão”, disse o relator. “Queremos encontrar resposta para mistérios que convivemos e não podem persistir na democracia”, completou.
A ministra da Secretaria dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, acompanhou a votação no plenário do Senado. Na saída, ela disse que este é um momento histórico. “É uma vitória histórica e inaugura uma nova etapa para o Brasil desde a redemocratização do país”.
Fonte: G1, 26/10/2011. Disponível em: http://g1.globo.com/politica/noticia/2011/10/senado-aprova-criacao-da-comissao-da-verdade-que-vai-sancao.html
*do blog Coletivo RJ Memória, Verdade e Justiça
http://www.coletivorj.blogspot.com/
O Coletivo RJ Memória, Verdade e Justiça é um espaço do qual participam diferentes entidades, movimentos e pessoas. Tem como proposição desenvolver atividades/ações relacionadas ao campo da Memória, Verdade e Justiça, tendo como diretrizes norteadoras as seguintes revindicações: Por uma Comissão da Verdade soberana e independente; Pelo cumprimento da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre a Guerrilha do Araguaia; Pela abertura de todos os documentos privados e públicos da época compreendida entre 1964/1988; Em defesa da memória dos lutadores e lutadoras da resistência à ditadura civil-militar. Para entrar em contato, basta enviar um mail para rjcoletivo@gmail.com
*do blog Coletivo RJ Memória, Verdade e Justiça
http://www.coletivorj.blogspot.com/
O Instituto Boal quer contribuir para divulgar esssa informação. Convidamos também para a leitura do texto “O Suicídio do Artista”.
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Vivemos num tempo em que é possível destruir o Maracanã, símbolo maior da cultura popular do futebol, e destinar dinheiro público (R$12 milhões) para um festival privado de rock (Rock in Rio). Por outro lado, o Rio não dispõe de um conselho de cultura com participação da sociedade na definição das diretrizes culturais carioca. Talvez por isso essa cidade tenha sido capaz de erguer a ex-futura Cidade da Música por inaveriguáveis R$500 milhões!
No final da década de 1990 o genial Augusto Boal implorava por um patrocínio ao espetáculo “O Suicídio do Artista” (texto mais abaixo) e vaticinava: a cultura morreu!
Você está convidado para o debate:
A Morte da Cultura
Que ocorrerá no dia 10 de novembro, quinta-feira, às 18h30;
No auditório do Corecon-RJ (Av. Rio Branco 109 – 19º andar, Centro).
Com a seguinte programação:
Ø Apresentação dos dados orçamentários referentes às questões culturais;
Ø Debate com:
1. O Dr. Maurício Andreiuolo, Procurador da República na área de meio ambiente e patrimônio cultural;
2. A Profª. Claudete Félix, curinga do Centro de Teatro do Oprimido;
3. O Economista Felipe Ribeiro, FUNARTE;
4. O Conselheiro Paulo Passarinho, mediador.
Ø Debate livre.
O acesso é livre, gratuito e sem necessidade de inscrição.
Até lá,
Equipe FPO-RJ
O Suicídio do Artista
Augusto Boal
– “Graças a V. Exa., podemos agora escolher nossos artistas!” – disse ao Ministro da Cultura um empresário feliz, em pública reunião, faz dois ou três anos, agradecendo-lhe a privatização da cultura.
Tempos atrás, cabia ao Ministério e às Secretarias, com quase exclusividade, o patrocínio das artes. Hoje, vai-se de porta em porta, pires, pratos de sopa ou cornucópias na mão! – o tamanho de recipiente depende da intimidade que se tenha com o poder. Para as empresas, alegremente autorizadas a usar dinheiro de impostos na estética publicidade dos seus produtos, foi grande negócio. Para os artistas, creio que não: dou meu singelo testemunho.
No ano passado, graças ao CCBB, dirigi uma experiência teatral de certa magnitude, a SambÓpera CARMEN, na qual se respeitavam as melodias de Bizet casadas com nossos ritmos.
Sucesso extraordinário. Tanto, que o New York Times publicou tremenda reportagem recheada de fotos do espetáculo que, para o jornal, não tinha equivalente em mais de cem anos de vida dessa ópera – agradável exagero! O diretor do Festival Paris-Quartier d´Été acudiu correndo, e convidou CARMEN para se apresentar no coração de Paris, no Palais Royal, teatro de mil lugares, cercado pelo Louvre e pela Commedie Française, em julho passado.
CARMEN é, por excelência, a ópera nacional francesa: sua versão sambística, em Festival tão prestigioso, causou espanto e admiração. Felizes, resolvemos reincidir e preparamos outra SambÓpera: Verdi, LA TRAVIATA, homenagem ao quarto centenário do gênero Ópera que nasceu com a famosa EURÍDICE de Peri-Rinuccini, composta para celebrar o casamento do Rei Henrique IV com Maria de Médicis.
Maiores atrativos publicitários, impossível: samba, ópera, Verdi, Bizet, Times, Paris, Festival… Estávamos certos de que os empresários fariam fila à nossa porta, gritando ofertas como se estivessem em pregão da Bolsa de Hong-Kong.
Não estavam… Fomos à cata da produção com cinqüenta cópias do nosso Projeto, CDs e partituras. A maioria das empresas consultadas já disse que o projeto é belíssimo: “Você, Boal, sempre inventando, heim?… porém… não combina com os nossos produtos.” Os comerciantes querem vender: nada mais lógico. Loucura nossa pensar que uma heroína-prostituta, que morre tuberculosa no quarto ato, fosse capaz de vender espaguete ou pertences de feijoada, por exemplo. Deveríamos, talvez, ter procurado um fabricante de penicilina ou pneumotórax: erro nosso!
Diante da ameaça de novas e contundentes recusas, pensei que, se não são mais os artistas que determinam seus próprios caminhos e sim os empresários – a quem devemos respeitosamente ajudar a vender suas mercadorias! – mais cedo do que se pensa, nossa arte, já razoavelmente moribunda, estará à beira do falecimento total e definitivo, em cova rasa.
Como denunciar essa morte silenciosa? Pois que de outra coisa não se trata, se não de morte, o fato de se deixarem artistas sem patrocínio. De que serviria Van Gogh sem pincéis e tintas? Beethoven e Mozart sem piano ou cravo? Embora eu não saiba tocar nenhum instrumento musical, por mais reles reco-reco que seja, nem tenha intimidades cromáticas com pincéis e tintas, pensei em suicídio. O Suicídio do Artista Sem Patrocínio!
O exemplo me veio do Vietnã: monges se matavam afim de atraírem a atenção do mundo sobre a guerra iníqua. Conhecendo as necessidades da propaganda, não morriam confortáveis em suas camas, solitários, ou bebendo cicuta em canudinho, como Sócrates, entre bons amigos: eram espetaculares e, em praça pública, ateavam-se fogo às vestes, diante de flashes e câmeras de TV.
Pensei que o Suicídio do Artista Sem Patrocínio deveria seguir as mesmas normas de teatralidade daqueles religiosos. No Brasil, porém, as pessoas andam tão atarefadas, completando seus magros salários correndo de um emprego a outro, que um homem, esturricando-se ao sol do meio dia, no Largo da Carioca, talvez não atraísse o público desejado; talvez não desse Ibope. Imaginei, então, uma orquestra modesta que atraísse transeuntes para perto do suicida: eu, é claro, porque nenhum dos meus colegas – sempre tão solidários e mesmo achando a idéia ótima! – aceitou o sacrifício, por mais que eu insistisse. Deviam ter lá suas razões.
Sendo a música de boa qualidade – como é, no nosso caso! – talvez corrêssemos o risco inverso, atraindo demasiada platéia: seria então necessário construir uma plataforma sólida para o incendiado, e arquibancadas à prova de fogo para os ávidos espectadores.
Labaredas são mais atraentes e coloridas em silenciosa noite escura do que ao sol gritante. Portanto, nosso espetáculo pirotécnico deveria ser realizado depois do anoitecer, o que nos obrigaria à instalação de, pelo menos, 20 ou 30 refletores.
Para gerir esse belo espetáculo incendiário, necessitaríamos maquinistas, eletricistas, e teríamos que contratar uma boa agência de promoções, imprimir convites e um programa explicativo da filosofia do evento – pois que a tinha! – em bom papel de seda, etc. Sobretudo, fazia-nos falta um excelente produtor. Isso não se faz sem dinheiro.
Recorremos então aos Captadores de Recursos, profissão inventada pela atual Lei de Incentivo à Cultura, como contribuição ao combate ao desemprego: são especialistas encarregados de fazerem as empresas soltarem a grana.
Até hoje nenhum Captador respondeu, sequer, à nossa demanda. O maravilhoso e emocionante espetáculo do Suicídio do Artista Sem Patrocínio fica, assim, adiado sine die… por falta de patrocínio. Talvez para logo depois da silenciosa e recatada Morte da Arte e da Cultura.
Pede-se não mandar flores.
Se, porém, sua vontade de prestar esta última homenagem fúnebre à nossa cultura em coma for irresistível, sugere-se o envio de doações, ajudas, subvenções, etc., ou simples palavras de afeto, a algum jovem grupo de artistas cênicos ou plásticos, que saberão explicar porque escolheram dedicar suas vidas à arte e à cultura, ao invés de atividades mais lucrativas como os leilões e a Bolsa, nesta época em que o Lucro e o Deus-Mercado são a mais recente encarnação do bezerro dourado.
O encontro de Porto Alegre foi extremamente mobilizador e suscitou o desejo de contribuir para o debate. A seguir, um texto enviado por Silvia Balestreri, organizadora do encontro.
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3 OU 4 PERGUNTAS PARA UM BOM FÓRUM
Silvia Balestreri Nunes1
Uma das modalidades mais utilizadas do teatro do oprimido no mundo todo – o teatro-fórum – é veículo de ativação e mobilização não apenas na hora de ser apresentado e de se convidar a platéia a intervir na cena – quando ela toma o lugar do(s) protagonista(s) para propor alternativas à situação mostrada, mas principalmente durante o processo de criação e montagem da peça. Os participantes-atores têm que se defrontar com uma série de questões para chegarem a construir o que chamamos um bom modelo para fórum – a peça propriamente dita. Cabe ao curinga sensibilidade para conduzir o grupo por tais questões: ainda que não sejam formuladas explicitamente, a resposta a elas terá efeitos sobre a qualidade do fórum, sobre a relação dos participantes entre si e sobre sua relação dali por diante com o tema e os problemas tratados.
Uma primeira pergunta com que cada um dos participantes da construção de um fórum tem que se defrontar, uma vez escolhido o tema, é:
Qual a opressão de vocês em relação a esse tema?
Quanto mais cheios de vida forem esses relatos, mais material se terá para criar os personagens e a cena. Um bom curinga já estará aí sendo atingido em sua sensibilidade, o que o ajudará bastante a conduzir o resto do processo: estará sensível às contradições, aos incômodos, à importância para cada um daquilo que está contando de si. Quando comecei a curingar, tinha muito receio de ser diretiva e acabava me omitindo de interferir em importantes momentos do processo. Só com o tempo descobri que, para dirigir e curingar, é preciso interferir, mas sempre de modo a não “atropelar” e a facilitar o movimento dos participantes, estando inclusive aberta a “dar ouvidos” às impressões que seus relatos e jogos de improviso suscitam em mim. Com essa primeira pergunta – “qual a opressão de cada um em relação ao tema?” – , inicia-se, de forma mais detida, um compartilhar de experiências, um movimento de coletivizar o que até então era vivido individualmente – início de uma verdadeira formação de grupo. “Grupo é ato” 2, ou seja, só começa a acontecer quando, p. ex., um conjunto de pessoas se move na direção de um mesmo objetivo. Um importante passo para isso é as pessoas compartilharem e encontrarem o que é comum no que costumam viver como “problema pessoal”. O fórum pode propiciar esse belo movimento, que é, a meu ver, dos mais importantes presentes na construção do modelo e cuja apresentação e discussão com uma platéia é apenas uma espécie de clímax dessa coletivização dos problemas e da procura, em conjunto, de sua solução.
Uma outra pergunta, após a narrativa das queixas e opressões, necessária para que se esboce melhor quem será o protagonista e pelo que ele lutará em cena, é:
O que vocês querem em relação a tudo o que foi colocado?
O que querem em relação às opressões, problemas e insatisfações que apontaram? Esse é um momento riquíssimo, em que, muitas vezes, o curinga acaba promovendo uma verdadeira “quebra” nas posturas anteriores (dependendo, é claro, do grupo e do tema em questão). É como se estivesse dizendo: “Tudo bem, entendi tudo de que vocês se queixam, mas o que querem? Pelo que querem lutar? Como gostariam que fosse?”Não há aí nenhum convite à idealização de uma situação inalcançável, mas uma pergunta sincera sobre o modo como pretendem dizer “não” a uma realidade opressiva. Em algumas situações, é difícil de responder, mas é fundamental para o grupo se defrontar até com a dificuldade de traçar rumos em determinados casos. Lembro-me de um fórum sobre relações amorosas nos dias de hoje, realizado por estudantes de psicologia. O primeiro momento, de compartilharem suas experiências sobre o tema foi relativamente fácil: falar da crise do casamento ou da atual mudança nas relações e no amor. “Sim, e o que vocês querem?”, perguntei depois. “O que vocês querem quanto a essas questões?” A simples colocação da pergunta já põe o grupo numa posição diferente: a de sair da lamentação e da passividade para uma posição ativa – essencial para fazer um bom fórum e para uma postura positiva na vida. Os atores precisam saber o que estão querendo discutir com a peça e ter uma noção do que querem conseguir quanto ao “problema” analisado, para poderem definir o que o protagonista do fórum quer e pelo que ele luta – ou mesmo quantos “protagonistas” haverá na cena.
Uma vez esclarecido, na medida do possível, o que o grupo quer, ajudando a delinear um ou mais protagonistas para a cena, é hora de se perguntarem:
O que atrapalha vocês de conseguirem o que querem?
Daí surgirá material para a construção dos antagonistas e de momentos importantes da peça. Às vezes, “o que atrapalha” é um tipo de organização social ou hierarquia, um modo de alguém falar, um tipo de relação em que se está enredado, ou mesmo uma culpa ou cobrança internalizados que impedem cada um de se mover. Neste caso, quando a própria pessoa é veículo de sua opressão, certamente está recorrendo a um tipo de censura e de repertório de culpabilização que está disponível no social: algo que é seu próprio pensamento e autocobrança (próximo ao que Boal chama os “tiras na cabeça”) pode, por exemplo, ser colocado na boca e na ação de um dos personagens antagonistas. O mais importante será que o protagonista ou outro personagem oprimido e as platéias do fórum tenham que se defrontar com isso, perguntando-se o que fazer com tais mecanismos e experimentando alternativas.
Já terá sido bastante valioso um processo em que um conjunto de pessoas tem que “encarar” sinceramente cada uma das perguntas anteriores. E o fórum, como todo bom teatro, não funciona bem com “mentiras”. Esse não é um processo exaustivo, os participantes devem falar de si apenas o suficiente para se fazerem ouvir, isto é, para que a cena seja o resultado de um trabalho verdadeiramente coletivo, para que tenha vitalidade nas coisas que afirma e que pergunta. Os participantes devem falar o suficiente para afetarem e serem afetados em sua sensibilidade, de modo a terem bom material para os jogos de improvisação e para a criação de personagens e diálogos. Lembro-me de um fórum, também entre alunos de psicologia, em que estes queriam discorrer sobre drogas e homossexualidade. Só para citar a situação mais simples ocorrida, havia no grupo tanto pessoas que já tinham experimentado diferentes tipos das chamadas “drogas ilícitas”, quanto pessoas que sequer se sentiam à vontade para falar sobre o assunto. A peça acabou girando sobre o preconceito, seja de que lado fosse, com lugar para diferentes tipos de personagens e posturas.
Apesar de já muito proveitoso o processo até aqui, uma pergunta fundamental para a criação da cena precisará ser respondida, pergunta que, como as demais, pode produzir interessantes ressonâncias na postura e na vida dos participantes:
Quais as saídas para o que vocês estão colocando?
Por onde é possível vislumbrar alguma transformação?
O grupo precisa acreditar que há saídas, senão não haverá o que buscar junto às platéias. Essa é uma garantia de que não se fará um fórum fatalista, o que não passaria de um “anti-fórum”. Certa vez, dirigindo sindicalistas demitidos por sua militância, no interior de Minas Gerais, quase acreditei, num primeiro momento, que não haveria saídas para a opressão que viviam, tal era o teor de seus relatos. Mas o fato de estarmos ali reunidos para realizar um fórum era o melhor sinal de que queriam fazer algo com aquilo e que era um primeiro indicador de que poderia haver saídas. As respostas e mesmo as dificuldades de se responder a essa pergunta apontam os caminhos do fórum: saber qual situação deverá ser encenada para tratar da opressão em pauta é reconhecer por onde é possível começar uma efetiva transformação do que se está denunciando. Essas “saídas” serão insinuadas no modelo, ainda que o protagonista não seja bem sucedido ao buscálas.
Talvez essas sejam algumas razões para tanta popularidade do teatro-fórum. Para fazer uma boa peça, o grupo se confronta com questões que reviram qualquer possibilidade de postura cristalizada, desencadeia-se um processo que aponta o tempo todo para o coletivo e cuja coroação serão os debates teatrais – as sessões de teatrofórum – engendrados com as diferentes platéias. Vale lembrar que tais perguntas nem sempre precisam ser explicitamente colocadas pelo curinga, mas elas estão implícitas e os participantes são o tempo todo convidados a fazer sua travessia até chegarem à peça. É uma forma riquíssima de se trabalhar e mesmo de se formar um grupo; estão incluídos aí o humor, o fazer artístico e a busca de transformação social. Quem quer mais?
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1 Professora do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde trabalha com o teatro do oprimido em disciplina, pesquisa e estágio. Participou do Plano Piloto da Fábrica de Teatro Popular e da primeira formação do CTO-Rio.
2 Concepção inspirada em Sartre. Ver o livro de Georges Lapassade: Grupos, organizações e instituições.
Publicado em METAXIS – A Revista do Teatro do Oprimido.
Ano I, nº I, dez 2001. p. 26 e 27 , quando a autora era Professora do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Atualmente é professora do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas e do Departamento de Arte Dramática da UFRGS, onde leciona Teatro do Oprimido I (Teatro Fórum) e Teatro do Oprimido II (Teatro Invisível e iniciação à formação de curingas).
Maria Rita Kehl lança 18 crônicas e mais algumas na Livraria da Vila
A Boitempo Editorial lançará o novo livro de Maria Rita Kehl, 18 crônicas e mais algumas, simultaneamente nos formatos impresso e ebook, no dia 26 de outubro, na Livraria da Vila, em São Paulo. A psicanalista retorna às livrarias com uma coletânea de crônicas, 18 publicadas no jornal O Estado de S. Paulo e outras 26 em veículos como Teoria e Debate, Folha de S.Paulo e Época, escritas ao longo da última década. Estão contemplados nesta obra textos célebres, como “Dois pesos…”, que expôs as fissuras de uma sociedade desacostumada com a participação dos mais pobres.
Maria Rita questiona o papel do psicanalista na imprensa: para ela, não se trata de explicar certos fenômenos e “comportamentos” que intrigam a sociedade (e ajudam a vender jornais), mas sim de escutar o sintoma social. “O melhor que um psicanalista pode fazer, na imprensa, é quase idêntico ao melhor que pode fazer um jornalista por vocação: indagar o objeto de seu interesse, para além dos automatismos ideológicos e do conforto da teoria aplicada”, afirma na apresentação do novo livro.
Além da psicanalista, da jornalista e da cidadã, as entrelinhas das crônicas de Maria Rita revelam ainda um olhar crítico e desembaraçado das convenções e uma forte identificação com o País e com o próprio percurso nele vivido – “Acontece que sou brasileira e tudo, aqui, me diz respeito” –, e também com a poesia das músicas, dos filmes e dos amigos que permanecem.
O artigo a seguir, de autoria de Julian Boal, está ainda em francês. Resolvemos publicá-lo mesmo assim por várias razões. Em primeiro lugar por ser muito interessante e em segundo por considerar que muitas pessoas falam francês, uma língua não tão difícil para os que possuem o espanhol ou o português como língua nativa. Por último, prometemos publicar a tradução em breve!
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Éléments de réflexion sur le Joker
Le seul objectif que s’assigne ce texte est d’apporter une contribution théorique et pratique sur le rôle du Joker. Cette fonction est la seule qui soit oui nouvelle dans le Théâtre Forum et pourtant très peu de textes[1] existent qui la décrivent ou la commentent. Ce texte vise donc à pallier cette lacune, mais il n’a en aucun cas la prétention de la combler entièrement.
Le fait que le Théâtre Forum ne soit pas une nouvelle page dans l’histoire du Théâtre[2] est à mon sens régulièrement prouvé par le fait que plusieurs troupes dans le monde ont réalisé des spectacles, et continuent à le faire, de Théâtre Forum en utilisant des textes dramatiques qui n’avaient absolument pas été conçus pour ce type de représentation. Le premier à l’avoir fait n’est autre qu’Augusto Boal lui-même lorsqu’il a « Forumisé » la Femme Juive, un texte de Brecht inclus dans Grand’peur et misères du IIIème Reich. Il y a quelques mois, Adrian Jackson mettait en Forum Woyzeck à Londres et j’ai eu des échos d’une expérience similaire réalisée avec Antigone en Croatie.
Il ne s’agit pas ici de discuter si de telles expériences sont pleines de sens ou même si elles furent couronnées de succès. Il me suffit juste de constater que pour que ces pièces deviennent Forums, l’unique ajout essentiel fut la figure du Joker. Tous les autres éléments y figuraient déjà sauf celui-ci, essentiel au Forum.
Il est donc normal que beaucoup de praticiens du Théâtre de l’Opprimé, ou de personnes aspirant à le devenir, s’interrogent sur ce nouveau venu.
J’y répondrai, en me nourrissant de mes propres expériences, des expériences dont j’ai été témoin, des discussions que j’ai eu. Je parlerai en premier lieu ce que je crois être la fonction essentielle du Joker et deuxièmement, je parlerai des trucs auxquels on recourt des jokers que j’ai rencontré dans plusieurs parties du monde.
Si la fonction du Joker est difficile, c’est parce qu’elle cristallise en elle tous les éléments du Forum. Le Forum idéal est théâtre, fête, assemblée générale, acte de solidarité, lieu de discussions et de prises de décision, une image d’une société idéale dont les membres ne subiraient plus les rapports de force, mais seraient capables de s’inventer. Il est également moyen pour essayer de parvenir à cette société, il est une adresse au Pouvoir et aussi une menace en ce sens qu’il peut toujours être l’ébauche d’une conspiration contre celui-ci.
Il n’est pas étonnant alors que le Joker devant assumer, et rendre visibles, autant de paramètres soit une fonction difficile. Mais je crois que les deux paramètres qui doivent vraiment servir de ligne directrice au Joker ne sont pas ceux que je viens de nommer : ce sont le respect de la parole de chacun et l’effort pour auto-activer l’ensemble de la salle.
Il y a là, à mon point de vue, une contradiction. Le respect absolu de la parole de chacun pourrait conduire à l’ennui pour le reste de l’audience, un ennui qui serait synonyme de passivité, de mutisme absent. Essayer en permanence que la salle soit « active » peut conduire le Joker à n’être plus qu’un animateur d’auditoire, un chauffeur de salles qui alignerait blague sur blague, passant de point d’orgue en point d’orgue, empêchant ainsi toute capacité de réflexion de la part des spect-acteurs.
Il n’y a pas d’autre moyen de résoudre ce paradoxe que de l’assumer pleinement, le mener de front, essayer de faire cohabité ces deux pôles contradictoires. Ces deux éléments sont nécessaires et imprescriptibles. Le respect de la parole de chacun est l’élément sans lequel le spect-acteur ne pourrait avoir la confiance nécessaire pour monter sur scène, donner ses mots, ses gestes au public ainsi qu’aux autres acteurs et au Joker. Ce qu’il dira peut être discuté, critiqué, jamais jugé. Il faudra parfois que le Joker l’interrompe, lorsque la solution n’évolue plus, lorsque l’élément imprévisible qu’il apportait s’est stabilisé dans un rapport de forces qu’il lui est défavorable et qu’il n’arrive pas à surmonter. Peut-être existe t’il d’autres raisons qui justifie l’interruption de son intervention, s’il use de la violence, si ce qu’il dit ou fait est absolument incompatible avec le rôle qu’il assume, mais cette interruption se devra, elle aussi, d’être respectueuse. Le Joker peut lui demander alors s’il pense avoir fini, s’il a quelque chose à ajouter.
Je crois que considérer que la seule et unique forme d’activer un spect-acteur est de le faire monter sur scène est une conception restrictive et qui si elle était vrai serait assez triste pour le Théâtre-Forum. En effet, supposons que l’on fasse un spectacle pour une cinquantaine de personnes, nous savons que seul 5 à 10 personnes feront des interventions. Quand advient-il des 40, 45 autres personnes ? Restent-elles inertes ?
Croire que seuls ceux qui montent sur scène se libèrent de leur condition passive et acritique est pour le moins méprisant pour les autres formes de Théâtre sociales, politiques et militants. C’est aussi une ressacralisation de la scène que de lui conférer, et à elle seule, la vertu de rendre libre ; nous serions bien de la « vulgarisation », au sens le plus haut de ce terme, donner au peuple, que désire le Théâtre de l’Opprimé.
Le Joker doit donc faire en sorte que tous participent. Il doit pousser les gens à la réflexion, être un miroir de leurs pensées, donner à l’assemblée ce que chacun lui a dit. Il doit être ce que Platon disait de Socrate « un taon au flanc de la société » : il doit les irriter dans le sens qu’il doit essayer, avec eux, de les mettre dans un état de créativité, de discussion tel qu’ils s’éloigneront de leurs schémas de pensée habituelle, que leurs raisonnements quotidiens leur apparaissent soudain comme étrangers. Il doit essayer de faire en sorte que l’apparition probable d’opinions contraires ne suscitent pas un repli sur des préjugés, mais au contraire pousse à la réflexion et au dépassement possible de ceux-ci.
J’ai assisté une fois à un spectacle-forum sur le sida dans une prison pour femmes au Brésil. L’un des nœuds du conflit où les spect-acteurs étaient invités à prendre la place du protagoniste était une scène où le patron d’une entreprise exigeait d’un candidat à l’emploi qu’il fasse des tests de santé dont un dépistage du sida, tests dont lui le patron aurait connaissance des résultats. Dans la salle, les opinions étaient partagées, certaines prisonnières trouvaient qu’il était juste que le patron sache si ces employés étaient séropositifs ou pas[3]. À un certain moment dans la salle, une des prisonnières à commencer à parler, elle parlait du préjugé dont souffraient les séropositifs, elle s’est ensuite déclarée elle-même comme séropositive et à raconter son expérience de la discrimination en des termes très touchants, elle fut ensuite applaudie par le reste de l’assistance. Dans ce lieu qu’est une prison brésilienne normale où les conditions sont si atroces que les prisonniers sont obligés de revêtir des masques de violence et d’animalité afin de préserver un minimum vital de privacité, cette prisonnière avait réussi à créer, ne serait-ce qu’un instant, une relation autre à travers laquelle les autres prisonnières ont pu lui manifester de la solidarité.
Le Joker aurait-il du l’interrompre ? Lui autoriser la parole qu’à la condition qu’elle vienne sur scène ? Je ne le pense pas. Si tout est Théâtre, alors reconnaissons que ce qui vient du parterre a également une valeur que nous ne devrions pas méconnaître ou sous-estimer.
Quelques trucs pratiques
Il n’existe pas de Joker parfait dans l’absolu. Il existe de Jokers parfaits dans des conditions précises. Si l’on est face à six cents personnes ou dix, on ne « joke » pas de la même façon. Face à un public surexcité ou apathique, lié par une lutte commune ou atomisé, fragile ou fort, avec la présence des oppresseurs dans la salle ou pas, le Joker doit répondre aux situations concrètes dans laquelle se trouvent les spect-acteurs.
L’image la plus approprié pour le Théâtre de l’Opprimé et le Théâtre social, politique ou dans l’éducation en général n’est pas celle d’une chaîne de montage : on ne met pas un individu à un bout de la chaîne et à la fin, on obtient tel ou tel résultat (la confiance, la tolérance, le respect,…). Nous évoluons dans des situations diverses et variées et nous devons réagir face à ces diversités. C’est pourquoi le Joker ne peut pas disposer de dogmes, mais seulement de trucs.
• Pour savoir si le Public est encore intéressé dans l’intervention :
Un certain temps après que l’intervention a commencé, le Joker peut s’approcher de plus en plus du lieu où se déroule l’action. Si lorsqu’il s’approche lentement du spect-acteur, le public commence à le regarder lui plutôt que le spect-acteur, c’est qu’ils attendent de lui qu’il fasse quelque chose, qu’il intervienne. S’il continue à regarder le spect-acteur, c’est qu’ils y trouvent encore de l’intérêt et veulent continuer à voir quels seront les rebondissements de son action.
• Pour chauffer la salle avant le spectacle:
– Expliquer les règles du jeu de la façon la plus simple et la plus claire.
– quelque jeux simples ; des jeux qui peuvent se faire assis (cercle et la croix, John and Paul, etc.) au début, si le public est réceptif, on peut ensuite les demander de se lever pour faire des exercices plus physiques.
• Pour chauffer la salle juste avant le début des interventions :
– Demander à tout les acteurs de se présenter en ligne. Le public devra dire comment il a vu tel ou tel personnage (par exemple : « couard », « paresseux », « mais avec un bon cœur »). L’acteur devra ensuite faire une statue où sera présent toutes, ou autant que possible, les caractéristiques décrites par la salle (en filant l’exemple, une statue d’un peureux au cœur d’or mais avec un poil dans la main)[4].
– Demander à la salle de se partager en petits groupes pour discuter de ce qu’ils ont vu et de commencer à réfléchir à des interventions.
• Pour encourager le public à monter sur scène :
– le Joker, lors de la deuxième représentation, doit se tenir dans une position visible pour le public. Si celui-ci tarde à réagir, il peut se déplacer dans l’espace qui sépare la salle de la scène en regardant le public pour lui rappeler qu’il doit réagir, qu’on attend quelque chose de lui ; le joker pourra même parler à l’audience, la taquiner : « Jusqu’ici tout est parfaitement normal pour vous ; si cette histoire se passait avec vous, vous agiriez exactement de cette façon ;… » En agissant de la sorte, le joker aura la possibilité de mieux voir les membres du public et d’essayer de dénicher celui qui se tortille sur sa chaise sans oser dire « Stop ». Lorsqu’une intervention surgira, le Joker devra alors se ranger dans une position moins visible : le spect-acteur qui est monté sur scène veut montrer sa solution et le reste du public veut la voir ; le joker ne doit pas être à ce moment-là une interférence.
– Interrompre l’action et poser des questions aux « spect-acteurs » : « Vous croyez vraiment que ce personnage n’avait aucune autre façon d’agir ? Vous croyez que ce personnage a adopté une bonne stratégie pour obtenir ce qu’il désire ? » et ainsi de suite pour essayer de créer une discussion d’où émergeront des propositions, des alternatives.
– Si un spect-acteur a commencé à parler depuis sa chaise mais résiste à l’idée de monter sur scène, on peut le faire applaudir par le reste du public pour l’encourager.
• Pour faire en sorte que l’ensemble du public soit actif :
– Faire en sorte qu’ils puissent toujours commenter les interventions après qu’elles aient eu lieu, ce débat pourra les stimuler et les encourager à monter sur scène par la suite. Tenter de faire en sorte que le débat ne s’articule pas sur des questions de valeur (« Est-ce que c’était une bonne intervention ? »).
– Ne jamais faire des conversations privées entre le Joker et un membre du public. Dès que l’un des membres du public pose une question ou fait un commentaire au Joker, celui-ci doit s’éloigner de lui pour qu’il soit forcé de parler plus fort. Si le reste du public n’a toujours pas entendu, le Joker peut répéter ce qu’il a dit, en le reformulant ou pas.
– Le Joker peut également exposer son point de vue, mais en laissant très clair qu’il s’agit d’UN point de vue et pas de la seule interprétation autorisée. En demandant par la suite au public, ce qu’il a pensé de son opinion et en acceptant la critique de celui-ci.
• Quelques autres conseils :
– Plus la personne qui fera le Joker sera timide, plus on la verra elle et moins on verra la fonction de Joker qu’elle assume. C’est un paradoxe qui veut que plus on est clair et expressif, moins on s’expose en tant qu’individu.
– Une séance de Théâtre-Forum doit finir quand les spect-acteurs ne sont pas encore rassasiés. Si on les gave d’interventions et de discussions sans fin, ils retourneront à une passivité que nous voulions précisément combattre. Ce qui est important, c’est que les transgressions faites sur scène se fasse également dans la vie. Pour cela nous devons stimuler et exciter les gens, pas les rendre apathiques. Leur envie d’intervenir, de transformer, il faut qu’ils la gardent aussi après avoir franchi les portes du théâtre.
Si mon texte finit ici, la réflexion sur le Joker, elle, doit continuer.
Disponível em http://www.theatreoftheoppressed.org/en/index.php?nodeID=45 . Acesso em 05/05/2011.
[4] C’est Luc Opdebeck, de la compagnie Formaat, qui m’a enseigné ce truc.
Caríssimos amigos,
É um convite, uma intimação, uma sugestão, uma mobilização, ou tudo isto junto. Mas seja o que for, acontece que no dia 31/10/2011 o TNR e a Escola Carioca do espetáculo Brasileiro, promovem um debate público sobre a questão das “Artes Públicas e de Políticas Públicas”.
Para que o papo não seja só teórico estamos pensando em fazer um grande oficinão público, com o tema “Rio de Janeiro, A cidade e a Lapa” . Estamos chamando isto de “Adeus a Lapa”. Pode ser bonito, com a músicas que nós conhecemos, as roupas que nós transformamos, no espaço em demolição do anfiteatro da Lapa, onde vivemos tantas emoções!!!. De como a arte pode discutir (e deve) uma questão urbana, envolvendo o cidadão e sua relação com a cidade em que vive. E que ferramenta poderosa os processos artísticos desenvolveram para discutir esta questão de maneira lúdica contundente e, sobretudo poética. E tudo isto no espaço público, colocando a arte a serviço da transformação e integração do cidadão com o mundo em que vive.
É para esse exercício público de liberdade e de liberdade e criação que estamos convidando todos, mas todos vocês.
Obra pública feita por particulares à serviço da cidade e de seus cidadãos. A Lapa está mudando, o Rio está mudando!! Como estará isto batendo no coração de cada um de nós? E de nós que vivemos e moramos, ou freqüentamos, ou trabalhamos na Lapa? Nós estamos previstos nesta modificação? Ou condenados a morte?
Que tal fazermos estas discussões ao vivo e a cores no coração da Lapa, com as músicas do Alessandro e os adereços do TNR?
Com liberdade entre as ruínas da praça.
Após esta “Cerimônia do Adeus”, nos reuniremos todos, ainda na praça, para discutir com autoridades, políticos e amigos a questão das Artes Públicas, e de Políticas Públicas que a contemplem.
Arte Pública obra feita por particular, só por ele. Porque o Estado não pode fazê-la. Por isso ajuda aqueles que se propõe a realizá-la, de graça
Amir Haddad
Porto Alegre, domingo 16 de Outubro
Tenho tendência a pensar, com ou sem razão, que texto para blog tem que ser breve, quase telegráfico, porque se não, ninguém lê.
Claro que é uma projeção do meu próprio sentimento, não gosto e me cansa ler no computador.
Vivo imprimindo milhares de coisas, atitude claramente antiecológica!
Mas é assim, na minha época não existia computador.
Dito isto, vou tentar escrever um pequeno texto para contar o que aconteceu em Porto Alegre.
Foi um domingo verdadeiramente alegre e muito rico em boas surpresas.
A primeira foi o encontro com Silvia, que organizou o encontro e convidou para participar dele um grupo grande de professores e animadores culturais da Universidade de Pelotas. Ficamos uma boa parte da tarde intercambiando idéias e colocando todas as questões que surgem quando se inicia um trabalho de TO com comunidades e também com crianças e adolescentes em situação de risco, as dificuldades e resistências.
É um trabalho difícil, muito árduo e é necessária muita persistência e espírito de militância para não desistir. A conclusão foi a mais obvia: temos que realizar mais encontros, constituir uma rede para que o intercâmbio constante nos dê sustentação.
Quero destacar a contribuição de Erika Oliveira, que está fazendo uma tese sobre violência contra mulheres na Universidade de Assis, no interior de São Paulo. Ela usa o teatro fórum na sua pesquisa e eu gostaria de insistir com ela para que escreva um texto ampliando mais o conteúdo da sua intervenção que vou tentar resumir aqui.
Erika relatou o sentimento de solidão e de frustração que tomou conta dela durante o período em que trabalhava tendo como preocupação principal o produto. E como conseguiu resolver esses impasses quando percebeu que no trabalho com TO o importa não é o produto e sim o processo.
Fico muito grata, mesmo, à Erika porque ela deu nome a uma preocupação que eu tenho.
Existe muitas vezes por parte dos curingas uma preocupação com o espetáculo.
Em minha opinião, não é esse o objetivo do teatro fórum.
Assim como eu o entendo, o teatro fórum deve ser, como já diz o seu nome, um debate.
O teatro fórum é um convite para pensar, pensar em grupo, pensar juntos, encontrar alternativas para situações aparentemente sem saída e colocar essas alternativas em ato, em ação, é o aspecto ensaio do TO.
Outro aspecto muito importante é a circulação de informações. Neste ponto, é fundamental que o curinga, que realiza a mediação entre as partes implicadas, reúna todas as informações possíveis. São particularmente importantes as informações de ordem legal. O grupo que participa do debate deve sair de uma sessão de TO munido de todas as informações que o habilitem a resolver as suas questões na sua realidade concreta.
Se o TO pode ser um momento de encontro divertido e agradável não é essa dimensão que deve ser privilegiada. Queremos que as pessoas que participam possam enriquecer as suas capacidades de resolver da melhor forma as opressões que sofrem e que, certamente, são muito pouco divertidas.
Erika, que trabalha com violência contra mulheres, com certeza já deve ter se confrontado com isso diversas vezes.
Bom, e paro por aqui hoje, se não o texto prometido, que foi anunciado breve, vai acabar quilométrico!
Coloco ponto final ao texto de hoje, porém não ao debate.
Convido Erika para continuá-lo e enriquecê-lo e a todos os que queiram participar.
Cecilia
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Escrevo hoje este texto a convite da Cecília para dar início a um diálogo que me permita, junto àqueles(as) que praticam Teatro do(a) Oprimido(a) no Brasil, pensar nas práticas características deste tipo de fazer teatral. Elas têm me permitido repensar as ferramentas metodológicas que podem ser acionadas dentro do campo da Psicologia e de outros campos de saberes/fazeres científicos. Antes de falar sobre isso, devo mencionar a curinga e professora Silvia Balestreri, que tem discutido e praticado o TO na academia e que, numa atitude generosa e, sobretudo, política, tem socializado esse saber dentro e fora do universo acadêmico, permitindo a abertura de espaços de reflexão que possam contribuir para o enriquecimento do método criado por Augusto Boal. O trabalho que desenvolvi junto com a minha orientadora, Maria de Fátima Araújo, faz parte de uma pesquisa de doutorado em Psicologia Social vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Estadual Paulista, Campus de Assis e discutiu o uso do Teatro do Oprimido como instrumento metodológico para a discussão da violência contra a mulher em algumas cidades do interior paulista. Através da capacitação de um grupo de não-atores/atrizes, composto por estudantes universitários, nós levamos um esquete para discutir, por intermédio do Teatro Fórum, o tema da violência doméstica e conjugal, junto às populações menos favorecidas. Dessas apresentações, vários saberes foram e estão sendo produzidos, dentre eles, um deve receber especial atenção dentro do campo das pesquisas acadêmicas: o TO deve ser entendido como ferramenta processual e não como uma prática que nos oriente em busca de um produto/espetáculo, sendo este muito mais uma consequência de tudo aquilo que se fez ao longo das oficinas. A nosso ver, inserido na ideia de processo, o TO poderia ser definido, no campo das metodologias, como uma ferramenta própria das pesquisas participativas, por se tratar de construção coletiva entre pesquisador(a) e pesquisados(as), na qual a voz de todos os sujeito é norteadora das opressões e ações que deverão ser discutidas e, quiçá, resolvidas. Para o campo específico da Psicologia, o TO aparece como um dispositivo político, emancipatório e alternativo que se propõe a trabalhar de modo amplo com várias questões da coletividade, produzindo várias rupturas nos discursos e práticas hegemônicas, dentre elas aquelas do próprio campo dos fazeres psi. No caso específico da violência contra a mulher, o TO pode ser definido como um método não apenas de investigação, mas também de intervenção social, na tentativa de produzir corpos menos assujeitados e, porque não dizer, corpos mais libertados e libertadores. Para finalizar, posso dizer que nós, dentro e fora da universidade, precisamos criar cada vez mais espaços para conversações a respeito deste método a fim de que possamos aprimorar nossa prática em prol de um mundo mais justo e igualitário.
Erika Oliveira – Universidade Estadual Paulista
Companheiro Boal,
A ti sempre estimaremos por nos ter ensinado que só aprende quem ensina. Tua luta, tua consciência política, tua solidariedade com a classe trabalhadora é mais que exemplo para nós, companheiro, é uma obra didática, como tantas que escreveu. Aprendemos contigo que os bons combatentes se forjam na luta.
Quando ingressou no coletivo do Teatro de Arena, soube dar expressão combativa ao anseio daqueles que queriam dar a ver o Brasil popular, o povo brasileiro. Sem temor, nacionalizou obras universais, formou dramaturgos e atores, e escreveu algumas das peças mais críticas de nosso teatro, como Revolução na América do Sul (1961). Colaborou com a criação e expansão pelo Brasil dos Centros Populares de Cultura (CPC), e as ações do Movimento de Cultura Popular (MCP), em Pernambuco.
Mostrou para a classe trabalhadora que o teatro pode ser uma arma revolucionária a serviço da emancipação humana.
Aprendeu, no contato direto com os combatentes das Ligas Camponesas, que só o teatro não faz revolução. Quantas vezes contou nos teus livros e em nossos encontros de teu aprendizado com Virgílio, o líder camponês que te fez observar que na luta de classes todos tem que correr o mesmo risco.
Generoso, expôs sempre por meio dos relatos de suas histórias, seu método de aprendizado: aprender com os obstáculos, criar na dificuldade, sem jamais parar a luta.
Na ditadura, foi preso, torturado e exilado. No contra-ataque, desenvolveu o Teatro do Oprimido, com diversas táticas de combate e educação por meio do teatro, que hoje fazemos uso em nossas escolas do campo, em nossos acampamentos e assentamentos, e no trabalho de formação política que desenvolvemos com as comunidades de periferia urbana.
Poucas pessoas no Brasil atravessaram décadas a fio sem mudar de posição política, sem abrandar o discurso, sem fazer concessões, sem jogar na lata de lixo da história a experiência revolucionária que se forjou no teatro brasileiro até seu esmagamento pela burguesia nacional e os militares, com o golpe militar de 1964.
Aprendemos contigo que podemos nos divertir e aprender ao mesmo tempo, que podemos fazer política enquanto fazemos teatro, e fazer teatro enquanto fazemos política.
Poucos artistas souberam evitar o poder sedutor dos monopólios da mídia, mesmo quando passaram por dificuldades financeiras. Você, companheiro, não se vergou, não se vendeu, não se calou.
Aprendemos contigo que um revolucionário deve lutar contra todas, absolutamente todas as formas de opressão. Contemporâneo de Che Guevara, soube como ninguém multiplicar o legado de que é preciso se indignar contra todo tipo de injustiça.
Poucos atacaram com tanta radicalidade as criminosas leis de incentivo fiscal para o financiamento da cultura brasileira. Você, companheiro, não se deixou seduzir pelos privilégios dos artistas renomados. Nos ensinou a mirar nos alvos certeiros.
Incansável, meio século depois de teus primeiros combates, propôs ao MST a formação de multiplicadores teatrais em nosso meio. Em 2001 criamos contigo, e com os demais companheiros e companheiras do Centro do Teatro do Oprimido, a Brigada Nacional de Teatro do MST Patativa do Assaré. Você que na década de 1960 aprendeu com Virgílio que não basta o teatro dizer ao povo o que fazer, soube transferir os meios de produção da linguagem teatral para que nós, camponeses, façamos nosso próprio teatro, e por meio dele possamos discutir nossos problemas e formular estratégias coletivas para a transformação social.
Nós, trabalhadoras e trabalhadores rurais sem terra de todo o Brasil, como parte dos seres humanos oprimidos pelo sistema que você e nós tanto combatemos, lhes rendemos homenagem, e reforçamos o compromisso de seguir combatendo em todas as trincheiras. No que depender de nós, tua vida e tua luta não será esquecida e transformada em mercadoria.
O teatro mundial perde um mestre, o Brasil perde um lutador, e o MST um companheiro. Nos solidarizamos com a família nesse momento difícil, e com todos e todas praticantes de Teatro do Oprimido do mundo.
Dos companheiros e companheiras do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
02 de maio de 2009
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