Augusto Boal

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Carta de Sábato Magaldi para Augusto Boal

18.07.2016

Sábato Magaldi, um dos mais importantes críticos do teatro brasileiro, morreu na última quinta-feira, dia 14. Além de amigo da vida toda, Sábato foi grande incentivador da carreira de Augusto Boal ainda nos anos de 1950 e um dos responsáveis pela entrada de Boal na direção do Teatro de Arena. Durante todos esses anos, Sábato e Boal trocaram muitas correspondências e, como homenagem, postamos esta carta enviada por Sábato em janeiro de 1980.

Carta Sábato Magaldi 1 Carta Sábato Magaldi 2
Transcrição:

“2/1/80

Meu caro Boal:

Lamento que o tempo tenha sido curto para a gente bater outros papos, fazendo um balanço da sua rápida visita. Desconfio que a sua viagem foi algo decepcionante: as perspectivas não se mostram animadoras, a situação econômica do Brasil vai de mal a pior, o teatro sai com dificuldade do violento quadro de repressão.

Todo mundo se queixa de que, apesar do êxito artístico de alguns espetáculos, financeiramente a temporada foi muito mal. Esse é um reflexo da situação geral do país, nada brilhante. Como sairemos da crise?

Imagino que, para você, não tenha muito sentido deixar o êxito europeu, em função de um futuro incerto , entre nós. Incerto de todos os pontos de vista – político e financeiro, sobretudo. Mas continuo a achar que, talvez, você deve encontrar uma fórmula para desenvolver seu trabalho aí e aqui. A volta às vezes, de vez em quando, deve trazer um grande alento.

Por outro lado, sobretudo de sua inquietação criadora, suponho que você esteja indeciso entre a possibilidade de aproveitar pelo menos alguns anos as experiências de teatro-foro, teatro-invisível etc., e o desejo de pesquisar outros caminhos. O ideal seria uma conciliação entre o já conquistado e a busca de uma nova linguagem, permanentemente. Mas falta tempo para as menores solicitações.

Como não pude comparecer à estreia de Fábrica de Chocolate, faltou uma última conversa, até para saber sobre o seu programa nos próximos meses. Tentei falar também com o Fernando Peixoto, mas não consigo encontra-lo. Parece que ele viaja sem parar.

Fiz um balanço de 79, no qual registro sua vinda ao Brasil. Quando for ao jornal, arranjarei um exemplar, para manda-lo a você. No dia, não consegui comprar o JT.

Agora que levo uma vida mais calma, com tempo para leitura e estudo, acredito que me tornarei um epistológrafo verdadeiro. Minha intenção é a de responder, de imediato, a todas as cartas. Veja você que tomei até a iniciativa deste diálogo, sem esperar que você se manifestasse. Escreva, que não ficará sem resposta.

Edna e eu desejamos tudo de bom para você, Cecilia e os meninos, no ano e na década de 80.

Sábato”

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