Augusto Boal

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Teatro Heleny Guariba

11.04.2013

Homenagem a Heleny Guariba
Teatro Studio 184 foi renomeado para homenagear a diretora teatral, professora e militante de esquerda desaparecida em 1971
03/04/2013
Eduardo Campos Lima,
de São Paulo (SP)
Em cerimônia realizada no dia 17 de março, o Teatro Studio 184, instalado desde 1997 na Praça Roosevelt, no centro de São Paulo, foi renomeado Teatro Studio Heleny Guariba, em homenagem à diretora teatral, professora e militante de esquerda desaparecida em 1971. O ato reuniu antigos amigos, companheiros de luta e colegas de teatro, como o deputado estadual Adriano Diogo (PT-SP), presidente da Comissão Estadual da Verdade “Rubens Paiva”, o escritor e dramaturgo Izaías Almada e a professora Elza Lobo.
“A mudança do nome do teatro é natural. Fui aluna e amiga da Heleny – e agora luto para preservar sua memória e trazer à tona sua figura”, explica Dulce Muniz, atriz e diretora teatral responsável pelo teatro.
Heleny Guariba era uma artista dedicada a pensar e a produzir um teatro político inovador em solo brasileiro. Em um período de estudos com o dramaturgo e diretor Roger Planchon, na França, entrou em conhtato com um projeto popular de teatro – que ela, ao regressar, procurou desenvolver e estimular em seu país. Dirigiu o Grupo Teatro da Cidade, em Santo André, e atuou com Augusto Boal no Teatro de Arena. Ao mesmo tempo, militava na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Presa e torturada em 1970, foi solta em abril de 1971 – para alguns meses depois, em julho, ser sequestrada por agentes da repressão e desaparecer.

A mudança de nome do teatro ocorre em um momento de retomada da história de Heleny e de tantos outros militantes vitimados pela ditadura civil-militar. Dulce Muniz foi uma das companheiras de Heleny Guariba a dar seu testemunho para a Comissão Estadual da Verdade. Integrante do Conselho Consultivo da Comissão, ela também está envolvida em outra iniciativa. “A comissão está produzindo vídeos nos quais atores e atrizes fazem a leitura de depoimentos e textos sobre as vítimas da ditadura em São Paulo”, explica.
Aos poucos, Muniz vai cumprindo a tarefa – política e artística – a que se propôs. “Fazemos um tipo de teatro que quer falar das lutas mais recentes do povo brasileiro, o que abrange a resistência à Ditadura. É caminhando que se constrói”.
Projeto “Caminhando”
Nessa busca por um teatro com relevância social, integra-se ao projeto artístico e político do grupo dirigido por Dulce Muniz, nesse momento, a encenação de um texto teórico marxista: A Necessidade da Arte, do alemão Ernst Fischer. Até setembro, o coletivo construirá um espetáculo-mural a partir da discussão do texto.
“Numa sociedade dividida em classes, temos a obrigação de tentar investigar como essa manifestação da humanidade que é a arte pode contribuir para a emancipação dos trabalhadores”, define Muniz.
Escritor e político austríaco, Fischer compôs um painel da história social da arte de um ponto de vista crítico, refletindo sobre as diferentes configurações que ela assumiu em cada momento histórico. O livro foi publicado em 1959 e ganhou traduções no mundo todo, sendo editado no Brasil alguns anos depois.
A ideia é que cada conjunto temático do livro seja assunto de leituras e debates promovidos mensalmente, todos contando com comentários de intelectuais como Olgária Mattos, Maria Sílvia Betti e Lauro César Muniz. “Cada tema será acompanhado por um desafio teatral, exercícios originados da discussão e organizados nos moldes dos desafios dos repentistas nordestinos”, aponta Dulce Muniz.
O trabalho de criação será, dessa maneira, paralelo à discussão crítica, produzindo-se e enriquecendo-se com ela. Parte desse processo poderá ser acompanhada pelo público. “Gosto muito do trabalho em progresso e repudio os produtos que se apresentam muito acabados”, afirma a diretora.
Na etapa final, uma grande reunião pública, com a presença de todos os debatedores, será marcada pela encenação do espetáculo parcial A Necessidade da Arte, construído até o momento. Mas Dulce Muniz sabe que o mural ainda deverá conter mais quadros, uma vez que o processo será contínuo e não se esgotará ali.
Peças em cartaz
Contemplado com o Prêmio Funarte de Teatro Myriam Muniz 2012, o Projeto “Caminhando” é um programa de continuidade dos trabalhos do Núcleo do 184. Por isso, duas produções anteriores do coletivo foram montadas novamente como parte das atividades.
Dassanta, escrita pela dramaturga Solange Dias, havia sido encenada pelo grupo em 2011. Conta a história de paixão e morte de dois vaqueiros que se apaixonam por uma mulher de beleza inatingível. Na montagem do Núcleo, uma trupe mambembe assume a função de narrar a fábula – e um contador de histórias, presente ao longo da encenação, intervém a todo instante, antecipando acontecimentos e direcionando os atores.
O Laço Cor-de-Rosa é um espetáculo para crianças de Dulce Muniz, criado a partir da obra homônima de Carlos Heitor Cony, e conta a história de um avô, de sua neta e de sua cachorra, que à noite se transforma.
A relação de Dulce Muniz com o teatro para crianças – ela recusa dizer “teatro infantil” – é antiga. “Faço desde quando comecei a atuar – e trabalhei por muitos anos no programa Bambalalão, da TV Cultura, contando histórias”. A diretora defende que o teatro deveria estar presente na escola desde a fase de alfabetização. “Luta-se para que haja computadores na rede escolar, mas seria preciso lutar para que houvesse grupos de teatro também”, conclui. Somente assim, segundo ela, o cidadão adulto poderá compreender a relevância social do teatro. Com a luta pela memória, verdade e justiça, a reflexão marxista e o trabalho com crianças, o Teatro Studio Heleny Guariba segue caminhando.
Projeto Caminhando
Programação Gratuita
Dassanta – todas as sextas, às 21h
Laço Cor-de-Rosa – todos os domingos, às 15h
A Necessidade da Arte
Palestras às 20h
08/04 – Profa. Dra. Maria Sílvia Betti
27/05 – Profa. Dra. Maria Cristina Castilho
25/06 – Dramaturgo e escritor Lauro César Muniz
09/07 – Museóloga Kátia Felipini Neves
05/08 – Dramaturgo e escritor Izaías Almada
01/09 – Espetáculo parcial – A Necessidade da Arte
Teatro Studio Heleny Guariba
Praça Roosevelt, 184 – Consolação
São Paulo – SP
Tel. 11 3259-6940
Este artigo foi publicado em Brasil de Fato

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